Os crimes virtuais e a antiga impunidade

19/08/2013 14:45

O uso da internet já não é mais uma novidade em nosso cotidiano. Inúmeros são os benefícios dela de correntes, tais como o pagamento de contas sem sair da casa, pesquisas (quem não se lembra da antiga enciclopédia!), estudos, viagens etc. Entretanto, alguns oportunistas, aproveitando-se da fragilidade da rede mundial de computadores, vinham cometendo uma série de condutas, capazes de causar danos de enorme monta a um sem número de pessoas. Foi daí, por sua repetição, que surgiram os chamados “crimes virtuais”, expressão equivocada, pois não havia Lei prevendo expressamente tais práticas como criminosas, sinal de que o ordenamento jurídico brasileiro não acompanhou a velocidade do crescimento desta fantástica tecnologia. Os oportunistas acompanharam.

Havia, então, uma lacuna na legislação, que apesar de reconhecida pelo legislador não era preenchida ante ao elevado número de Projetos de Lei (PL) em tramitação e das demais atividades inerentes à função parlamentar.

Desta feita, a punição (dentre as possíveis) mais aplicada era ligada ao delito de estelionato, previsto no art. 171 do Código Penal de 1940, especialmente àqueles que induziam as pessoas, através de artifício, visando à compra e venda de mercadorias via internet, na qual a vítima entregava a quantia estipulada, sem receber o bem adquirido.

Foi necessário o cometimento de um fato contra a atriz global Carolina Dieckmann (que teve copiado de seu computador 36 fotos íntimas e mostradas ao público) para que os membros do Congresso Nacional dessem a devida importância a necessária proibição, em âmbito penal, de tais práticas que se tornavam cada vez mais comuns. Assim, o Projeto de Lei 2.793/2011, do Deputado Federal Paulo Teixeira (PT-SP), que tramitou em regime de urgência e em tempo recorde, transformou-se na Lei 12.737/2013, que reformou o Código Penal e acrescentou os seguintes dispositivos: artigos 154-A, 154-B, 266, §1º, e 298.
Ocorre que, ao mesmo tempo em que a inovação veio a suprir uma lacuna deixada pelo legislador, a Lei dos Crimes Informáticos vem sendo bastante criticada.
Um dos dispositivos mais atacados, sobretudo pelos especialistas em Direito Digital, é a tipificação do art. 151-A do Código Penal, que tem a seguinte redação: “Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidade para obter vantagem ilícita”. Quer dizer que tal delito apenas poderá ser praticado caso a vítima tenha criado algum obstáculo (segurança) para o acesso de terceiros em seu computador e o agente o viole este dispositivo de segurança. Assim, a obtenção de dados por invasão a dispositivo alheio quando a vítima o esqueceu ligado e sem empecilhos, tornará o fato não criminoso (fato atípico).
Outro ponto duramente combatido diz respeito ao tamanho da pena, que vai de 3 meses a 1 ano, além da multa, deixando o procedimento nos ditames da Lei de Juizados Especiais Criminais, que, principiologicamente, preza pela não aplicação de prisão (restritivas de direito ou multa).
Apesar das críticas, é inegável que a Lei dos Crimes Informáticos veicula  importante inovação à Legislação Penal Brasileira, na medida em que supre o vazio existente e concretiza antigo anseio social, que é a salvaguarda da intimidade e da privacidade através de dispositivos informáticos.
Com o fim de dar amplo conhecimento ao recém criado ato normativo, segue abaixo a Lei 12.737/13, íntegra.

LEI Nº 12.737, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2012.

 

Dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; e dá outras providências.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: 

Art. 1o  Esta Lei dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos e dá outras providências.  

Art. 2o  O Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, fica acrescido dos seguintes arts. 154-A e 154-B:  

“Invasão de dispositivo informático  

Art. 154-A.  Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita:  

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.  

§ 1o  Na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput.  

§ 2o  Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta prejuízo econômico.  

§ 3o  Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:  

Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.  

§ 4o  Na hipótese do § 3o, aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos.  

§ 5o  Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra:  

I - Presidente da República, governadores e prefeitos;  

II - Presidente do Supremo Tribunal Federal;  

III - Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou  

IV - dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.”  

“Ação penal  

Art. 154-B.  Nos crimes definidos no art. 154-A, somente se procede mediante representação, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos.”  

Art. 3o  Os arts. 266 e 298 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passam a vigorar com a seguinte redação:  

“Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública 

Art. 266.  ........................................................................ 

§ 1º  Incorre na mesma pena quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o restabelecimento.  

§ 2o  Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública.” (NR)  

“Falsificação de documento particular 

Art. 298.  ........................................................................ 

Falsificação de cartão  

Parágrafo único.  Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de crédito ou débito.” (NR)  

Art. 4o  Esta Lei entra em vigor após decorridos 120 (cento e vinte) dias de sua publicação oficial. 

Brasília, 30 de novembro de 2012; 191o da Independência e 124o da República. 

DILMA ROUSSEFF

José Eduardo Cardozo

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